19.6.09

O pote de ouro

Acordei com uma vontade de abraçar. Sabe aquele abraço bem apertado que tira com pinça a dor da alma? Esse. Decidi ir atrás.
Comecei a andar pelo Centro e procurar alguma loja que vendesse. Nem nos camelôs encontrei.
Passei na igreja, ascendi uma vela e esperei: nada.
Fui pra feira, de imediato corri pra barraca da laranja, quase todo mundo gosta de laranja, então, pensei, é lá. Nem bagaço de abraço.
Quem sabe na farmácia? Só com receita, a moça falou.
Então, pode ser que na floricultura. Passei em frente e vi que não havia muita gente dentro, mesmo assim entrei. Perguntei se tinham alguma flor que comprando ganharia um abraço. O moço relinchou um não. Decidi, de qualquer forma, comprar uma rosa vermelha, sentar-me no chão do calçadão, abrir os braços e esperar.

No início percebi olhares em minha direção, depois notei que desviavam, outros nem se quer baixavam os olhos. Insisti. Com a rosa na mão, estava pronto para abraçar quem quer fosse, apenas um abraço de verdade. De repente começou a chover e todos corriam muito pra tentar desviar da água. E eu permaneci ali!
O comércio baixou suas portas e a chuva se foi. O Sol trouxe o arco-íris. Atônito, fui atrás dele. Sempre ouvir dizer que havia um pote de ouro, pra mim isso era balela e também não me lembrava se era no início ou no final. Tão pouco sabia onde o arco acabava e começava naquela rua. Mas fui, segui as cores, as luzes. Quando me dei conta algumas pétalas da minha rosa vermelha estavam ficando pelo chão. Pensei: é a natureza.

Quando já havia caminhado o suficiente para sentir minhas pernas doerem, me deparei com um senhor de bastante idade, sentado sobre uma pedra, com as calças arriadas até o joelho, um cachimbo na boca, um chapéu de palha meio de lado na cabeça e com um olhar bondoso e sereno. Observei ao me aproximar que ele tinha ao lado dele uma lata dourada, pensei ser o tal pote de ouro. Mas como ali teria um tesouro? E quando mais perto ainda cheguei vi que a lata estava cheia de rosas vermelhas. Não falei nada. Sentei-me em frente à pedra e fiquei fitando-o por alguns segundos. Ele retirou o chapéu e pediu para que eu colocasse a única pétala que havia sobrado da minha rosa ali dentro. Sem me opor, acatei. Não sei por que, mas a presença dele me deu vontade de chorar.

Ainda com lágrimas nos olhos perguntei:
- Por que não encontrei ninguém disposto a me dar um abraço? Fui a diversos lugares, fiquei na rua esperando de braços abertos e nada. Será que estava pedindo demais?
Com uma expressão de infinita bondade ele colocou a única pétala sobrevivente dentro da lata dourada e voltou o seu olhar para o meu e disse:
- Bonequinho, sou um velho que fala errado e sem muitos dentes na boca. Se você quiser pode vir aqui e nos abraçamos.
Com os olhos encharcados não hesitei, ficamos abraçados o tempo suficiente pra eu me lembrar da Luciane e dos seus olhos doces, da Ana Clara e seu abraço forte, da Sonia e sua paz, da Gil e sua gratidão, do Felipe e sua lealdade, da Vanessa e sua sinceridade, do Afonso do tempo da escola, do pessoal da faculdade, do meu primo que não abracei antes de partir e lembrei também da Monica que não gosta de abraço; de repente meu coração apaziguou. Não tinha vontade de desabraça-lo. Ali fiquei por mais algum tempo. Até que indaguei:
-O que faz o senhor aqui.
Envergonhado ele respondeu:
- Sou só o velho da lata dourada, que todos os dias deixa rosas vermelhas nas floriculturas.
No caminho de volta pra casa tinha certeza que havia encontrado o pote de ouro.