22.7.09

Desabafo de um Sofá

Ei! Que abuso é esse do Elevador de querer abrir o bico e falar o que sente. Onde já se viu. De tão indignado que fiquei, resolvi subir no palanque do Clube do Bem e proclamar minha independência. Pois bem, meu nome é Sofá. Diferente do Elevador, eu sim, estou presente em todas as casas. Todo mundo me tem (adoro isso, me sinto importante) às vezes sou de dois, três e até viro cama. Já aviso: não me confundam com cadeira, ainda mais essas solitárias, de canto. Gente, ninguém se dá bem com elas, cadeira sozinha não é bom sinal! Vou pular essa parte. Mas quero usar esse espaço pra dividir com os sócios o que é viver com as bundas.
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Minha primeira casa foi um sobradinho numa cidadezinha em Minas, minha nossa, o que foi aquilo? Queriam de todo jeito me enfiar numa escada caracol. E a Dona Rosa, ficava gritando sem parar: cuidado! cuidado com meu Sofá! Naquele dia, entre uma volta e outra da escada, me dei conta que exerceriam sobre mim um exacerbado sentimento de posse. Odeio isso. No fim tive que entrar, todo e em partes, pela janela. Teve uma vez, que comecei a namorar um sofá de couro bege, pelo amor a sala de estar. Ele tinha ciúmes até das pipocas que caiam em mim. Não, né? Hoje vivo só, num escritório.
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Meu primo, esses corinos meia boca, foi comprado pra viver lá no morro do Alemão, no Rio. Caraca! Ele nos contou, na sessão dos Sofás Anônimos, que a sua dona coloca comida entre as molas dele. Parece que os bandidos roubam tudo. Coitado, chorava enquanto relatava que estava se sentido invadido. O pior foi a família Chenilli, pessoal, barraco na alta sociedade sofazeira; a Casas Bahia comprou o direito de uso deles e fizeram modelos populares em massa. No estoque, em Jundiaí, estão todos os “dois e três lugares” de cores púrpura, areia e turquesa; enfileirados a espera de serem vendidos após o anúncio na TV, domingo, durante o Fantástico. O patriarca da família entrou em crise de identidade.
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Esses dias em Manaus, um casal de jovens recém casados, chegou à loja e viu o meu tio. Logo de cara gostaram. Realmente meu tio tem estilo, todo metido porque foi promovido a design moderno e fica na vitrine. O casal pechinchou, disseram que pagariam a vista e tudo mais. Gente, meu tio contado, o encosto removível dele chegava a se soltar: “fui comprado à vista”, gabava-se ele. Mas o pior é que casal o colocou num sítio. Isso ele não contou, mas descobri com a cadeira solitária e fofoqueira. Na realidade, o sítio é um lugar onde acontecem encontros de swing. E tudo rola em cima do meu tio: o sofazão da alegria!
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Já que adentramos esse assunto, dias atrás estávamos no estoque do Magazine Luiza e o assunto era esse: sexo. O povo que trepa na gente. Depois que inventaram o chaise, então. E o pior que é sempre uma coisa rápida ou o início de transa. Muitos Sofás, assim como eu, reclamam que começam na gente e na melhor parte vão pro quarto. Ei! Já que tirou, mostra, né! E ó, não adianta passar cuspe: esperma não sai com saliva. Mas pelo amor de Deus não nos impermeabilize, sufoca!
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Outra coisa, não me dou bem com pufs e mesas de centro. E odeio que coloquem muitas almofadas sobre mim, isso faz minha rinite atacar dificultando minha respiração. E não tentem me combinar com cortinas e tapetes, gente, não coloquem todas as expectativas de “lar-doce-lar” em nós, meros Sofás, por favor. Ah! Lá em Salvador minha madrinha montou uma associação que pretende lutar contra animais que gostam de dormir em Sofás: como gatos. Ei, cascata dourada de gato ninguém merece. Eu apoio minha madrinha!
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Para finalizar um recado: me sinto menos quando nos encartes de lojas tem o aviso “meramente ilustrativo”, como assim? Fiz anos de análise para ser quem sou. Outra coisa, se não tiver quarto de hóspedes parem de chamar quem quer que seja para dormir na casa de vocês, caso contrário, acaba sobrando pra mim e baba na minha cara, não! E...bunda, amigos, pelo amor a humanidade, a limpeza da bunda na hora do banho é básico e essencial. Me desculpem o linguajar, mais cheiro de rabo sujo, não dá! Que isso. E tem gente que dá uns peidinhos que saem só um arzinho, sabem? Carniça pura. Ficamos combinados: quando forem sentar, não se jogem, sou de mola e posso quebrar, se tiverem suados não sentem em mim, sou nojento! Evitem me reformar, prefiro que me troquem ou me aposentem. Tentem não me limpar com aspirador, pois tenho cócegas. E limpem as bundas, assim, poderemos viver melhor por mais tempo.
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Obrigado pelo espaço, Sofá de dois lugares.