27.1.10

O mal de Sabrina


Na vizinhança Sabrina era conhecida como a menina de sorte. Daquelas que se reclamasse da vida estaria pecando. Desde a primeira comunhão era assim: boa aluna, ótima estagiária, excelente filha. No entanto, de uns tempos pra cá a moça chorava sem parar.
Os motivos ela jurava de pés juntos não saber. Apenas dizia haver dentro dela um sentimento que a incitava a não querer mais acordar.
Os pais atônitos tentaram médico, água benta, cartomante, viagem de navio; entretanto, nada foi capaz de motivar Sabrina a deixar a maldita cama.
27 dias e os comentários não puderam ser evitados, pois ninguém entendia porque uma moçoila bem criada, com um bom emprego, estudada, bonita e cheia de saúde cairá de cama.
Arriscaram olho gordo, gravidez, solitária, água no joelho e até encosto. As tias de longe vieram para fazer simpatia. A amiga da família lá do norte mandou uma garrafada. A avó fez novena para Santa Rita e nada.
38 dias e o pai de Sabrina já não mais duvidava de cirurgias espirituais. No trabalho os clientes perguntavam pelo repentino desaparecimento. Os casinho de final de semana começaram a ligar e a mãe, coitada; pelos cantos, chorava desconsolada.
54 dias e nem sinal de melhora. A linguaruda da Lucia, da casa amarela, sugeriu que os pais já fossem procurando uma funerária e deixassem tudo prontinho para evitar correria.
Faltando um dia para completar 73 de cama, Sabrina, acordou, se maquiou, vestiu o uniforme, abriu as cortinas, fitou a cama por quase duas músicas, deu um sorriso espaçoso e foi tomar café da manhã.
Pasmados a família não sabia se continuava a chorar ou se sorria. A mãe correu pra cozinha, pegou mais geléia de morango, torrou pães, fez um mingau de chocolate e mal notou que a filha já estava de saída.
O pai abobado, gritando, conseguiu pega-la ainda na porta e ofegante indagou:
- O que aconteceu, minha filha?
Com o mesmo sorriso espaçoso Sabrina respondeu:
- Cansei de boicotar minha felicidade.