7.9.09

Ensina-me a rezar


A pensão de corredores longos, paredes frias, banheiros pequenos e vista para os panfleteiros do Centro da cidade era o que tinha a ofertar.
Você aceitou. Sem se preocupar com o moço da portaria que nem se quer levou seus olhos em direção aos nossos. Pegamos a chave e nos perdemos.
No colchão sem molas, contemplamos um céu pintado por algum pintor que ali ficara e, sem dinheiro para arcar com as despesas, fez um escambo com o dono da hospedaria.
Por algum tempo nada falamos, lembra? Apenas um entrelaçar de mãos bem fortes. Até que sem mais poder resistir deixei de ser eu.
Fui ao teu encontro e ali queria morada. Fomos embalados pelo violinista de feições nordestinas que roubava as atenções dos passantes que corriam para casa no final do dia, bem na esquina da prefeitura. Quando tocou sua música, nem se deu conta que suas mãos desviavam dos fios descascados.
Existimos com veemência.
Será que havia serviço de quarto? Não nos demos conta. O encontro das salivas não deixou a sede chegar.
Re-existimos.
Engraçado: quando estou com você sou diferente daquilo que sonho ser. Tens o dom de me transformar num autista.
Não te falei, mas adorei ver televisão nos seus braços. Levando nossa jura adiante de sermos sinceros sempre, extasiei-me mesmo inalando seu cheiro. Lembro-me que sorria com a barriga e aquelas pequenas contrações não me deixavam dormir e sonhei acordado.
A chuva forte nem avisou que viria. Se soubesse rezar pediria para que chovesse sempre na hora das partidas.
Você ficou. Fui buscar o que comer. Pão molhado no café um do outro.
Dormimos emaranhados.
Queria ter te acordado durante a noite e te contar meus sonhos. Resisti.
Chorei quando despertei e não te vi.
Será que voltas?
Ensina-me a rezar.